PROJECT FOR CONTINUOUS IMPROVEMENT IN A MEDICINE SERVICE: “IN THE REMOVAL OF THE URINARY CATHETER IS THE GAIN”
Conceição Fernandes da Silva Neves** | Natália Soares da Silva*** | Tânia Cristina Miranda Mariano**** | Maria João Ameixoeiro Eufrásio***** | Marina Margarido Ribeiro Santos******
**Enfermeira Chefe no Centro Hospitalar Baixo Vouga – Unidade de Aveiro,Serviço de Especialidades Médicas/ Unidade AVC e Medicina III e Professora Adjunta Convidada na Escola Superior de Saúde da UA | Email: conceicao.neves.12132@chbv.min-saude.pt
***Enfermeira Especialista em Médico Cirúrgica no Centro Hospitalar Baixo Vouga – Unidade de Aveiro |Email: Natalia.Silva.22138@chbv.min-saude.pt
****Enfermeira Especialista Médico Cirúrgica no Centro Hospitalar Baixo Vouga – Unidade de Aveiro | Email: Tania.Mariano.12113@chbv.min-saude.pt
*****Enfermeira no Centro Hospitalar Baixo Vouga – Unidade de Aveiro | Maria.Eufrasio.12095@chbv.min-saude.pt
******Enfermeira no Centro Hospitalar Baixo Vouga – Unidade de Aveiro | Email: Marina.Santos.12088@chbv.min-saude.pt
RESUMO
Introdução: A algaliação é um procedimento que tem subjacente riscos, a implementação de feixes de intervenções representa na atualidade uma conduta a seguir. Objetivos: Identificar os motivos para a algaliação, identificar fatores que contribuem para a permanência da sonda vesical. Método: Estudo quantitativo, descritivo, correlacional e transversal realizado num Serviço de Medicina durante seis meses. Resultados: Estiveram algaliados 207 doentes, sendo 90,3% algaliados no hospital. A média de idades foi de 78,52 (± 13,106), predominaram indivíduos sexo feminino (N=126; 60,9%), a média de dias de algaliação foi de 3,77 dias (±4,355). Os motivos mais frequentes para a algaliação foram a monitorização da diurese em doentes (críticos e não críticos) e a retenção urinária. Conclusões: A implementação deste projeto permitiu conhecer a realidade do serviço de Medicina e implementar medidas em conformidade, reduzindo os dias de algaliação dos doentes e as consequências que daí advéem.
DESCRITORES
Sonda vesical; Cuidados de enfermagem; Retenção urinária; Projeto melhoria; Tempo de algaliação; Desalgaliação precoce.
ABSTRACT
Introduction: The removal of the urinary catheter is a procedure that has underlying risks, the implementation of an intervention bundle currently represents the conduct to follow. Objectives: To identify the reasons for the urinary catheter insertion, to identify factors that contribute to the permanence of the bladder tube. Method: quantitative, descriptive, correlational and cross-sectional study conducted in a medical service for six months. Results: 207 patients were analyzed, 90.3% of whom were in hospital. The average age was 78.52 (± 13.106), females predominated (N = 126; 60.9%), the average number of days of use of the urinary catheter was 3.77 days (± 4.355). The most frequent reasons for the insertion of the catheter were the monitoring of diuresis in patients (critical and non-critical) and urinary retention. Conclusions: The implementation of this project made it possible to know the reality of the medical service and to implement measures accordingly, reducing the patient’s catheterization days and the resulting consequences.
DESCRIPTORS
Bladder tube; Nursing care; Urinary retention; Improvement project; Duration of catheterization; Early removal of the urinary cateter.
INTRODUÇÃO
A Infeção do trato urinário associada à sonda vesical (ITUSV) é uma das mais frequentes infeções associadas aos cuidados de saúde (IACS) e é o maior efeito adverso associado à utilização da sonda vesical(1).
Nos Estados Unidos da América (EUA), Europa e países em desenvolvimento, a frequência de infeção do trato urinário (ITU) é, respetivamente, de 12,9%, 19,6% e 24%. Em contexto hospitalar também o uso de sonda vesical (SV) é a causa mais comum de ITU(2).
Em Portugal, a ITU é o segundo tipo de infeção mais frequente. Em estudos de prevalência realizados em 2010 e 2012, a nível nacional, representava cerca de 20% das IACS e a taxa de ITU em utentes portadores de SV comparativamente a utentes sem SV era respetivamente de 7,9% para 1,2 % (2010) e 7,4% para 0,9% (2012)(3-4).
Durante um internamento, 15% a 25% dos doentes podem vir a ser algaliados e o risco de adquirir uma bacteriúria varia entre 3% a 7% diariamente com SV, podendo chegar aos 100% em 30 dias(5). Cerca de 50% das algaliações são desnecessárias(6).
O maior fator de risco para adquirir uma ITUSV é a permanência da SV, sendo necessária a redução do número de algaliações e os dias da sua permanência(7-8).
A prevenção é a chave para reduzir as ITUSV através de abordagens multimodais, com monitorizações contínuas dos resultados e dos processos, formação dos profissionais, apoio e adesão dos gestores assim como a comunicação entre as equipas e a mudança do paradigma(9).
Em Portugal, a Direção Geral da Saúde (DGS) lançou uma norma com orientações que recomenda serem implementadas intervenções de forma integrada na prevenção de Infeção Urinária Associada ao Cateter Vesical(1).
Neste contexto, implementou-se no Serviço de Medicina Interna, um Projeto de Melhoria Contínua intitulado “No desalgaliar é que está o ganho” com vista à implementação de boas práticas, através de uma abordagem multimodal, indo de encontro às orientações da DGS e do Centers for Disease Control (CDC). Anteriormente à implementação deste projeto, não existia registo no processo clínico da indicação para algaliação e não era realizada sistematicamente uma avaliação da necessidade de permanência do cateter urinário. Perante esta realidade, foi realizada uma formação a toda a equipa de enfermagem onde foi apresentado o projeto e iniciou-se a monitorização de todos os doentes algaliados no serviço.
Assim, com a implementação deste projeto pretende-se:
- Identificar as razões para a algaliação dos doentes no internamento;
- Identificar os fatores que contribuem para a permanência da SV;
- Diminuir o tempo de permanência da SV;
- Reduzir o número de ITUSV.
- Verificar se existe diferença em relação à duração da algaliação entre homens e mulheres;
- Verificar se existem diferenças entre os doentes que fazem episódios de retenção urinária e os que não fazem.
MÉTODO
Estudo quantitativo, descritivo, correlacional e transversal realizado no Serviço de Medicina III do Centro Hospitalar do Baixo Vouga E.P.E. (CHBV) de outubro de 2017 a abril de 2018. A população é constituída por todos os doentes que estiveram algaliados no serviço nesse período. Foram incluídos todos os doentes algaliados independentemente do local da algaliação. Foram excluídos deste estudo os doentes com outros dispositivos médicos, nomeadamente sonda suprapúbica, nefrostomia e urostomia.
A amostra é não probabilística, de conveniência e constituída por 207 indivíduos.
A recolha de dados foi realizada através do preenchimento de um formulário individualizado para cada doente algaliado. No formulário constam variáveis sociodemográficas e clínicas, nomeadamente:
- Dados sociodemográficos: idade, sexo.
- Aspetos relacionados com a algaliação: se o doente chegou algaliado ao hospital, local onde foi algaliado, data de início da algaliação (é considerada a data de entrada no serviço de medicina III para os doentes que já chegam algaliados ao serviço. Doentes algaliados no serviço assume-se a data de algaliação), data de fim da algaliação (considera-se a data em que o doente ficou definitivamente desalgaliado), razão para ausência de data de fim de algaliação (falecimento do doente, transferência do doente ou indicação para manter algaliação), número de tentativas de desalgaliação.
- Motivos para a algaliação: foram considerados como critérios válidos para algaliação: monitorização de diurese em doente crítico, retenção urinária, ferida/úlcera em doente incontinente, medidas de conforto/cuidados paliativos, pós-operatório (ex: cirurgia urológica) e necessidade de imobilização por trauma.
Outros critérios (Monitorização de diurese e outros).
- Uroculturas: local da realização da urocultura, a forma como foi realizada (algaliação intermitente, colheita por ponta assética, micção espontânea) e o resultado da mesma.
O número de dias de algaliação foi calculado pela diferença entre a data de fim de algaliação e a data de início.
Para o preenchimento do formulário foram utilizados os dados contantes no processo clínico (Sclínico), sistema de informação desenvolvido pelos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, comum a todos os prestadores de cuidados de saúde e centrado no doente.
Para o tratamento estatístico dos dados foi utilizado o Statistic Package for the Social Sciences (SPSS), na versão 19.0.
Na analise dos dados recorremos à estatística descritiva que permite descrever as características da amostra, caracterizando as relações entre duas ou mais variáveis e ainda à estatística analítica. Para compararmos os parâmetros populacionais e antes de aplicarmos os testes estatísticos, aplicamos o teste de Klmogorov- Smirnov (como teste de normalidade da distribuição), para avaliar se as variáveis em estudo apresentavam ou não distribuição normal dos seus resultados. O teste revelou que as variáveis não apresentavam distribuição normal (todas as variáveis apresentaram valores de p < 0,05 e optamos por realizar, testes não paramétricos: teste U de Mann-Whitney, de Kruskall- Wallis. Na análise estatística utilizámos os seguintes valores de significância: p<0,05 (diferença estatística significativa) e p≥0,05 (diferença estatística não significativa).
O cumprimento dos procedimentos ético-legais envolveu a solicitação de uma autorização formal ao Diretor do Serviço de Medicina e do Conselho de Administração, após aprovação da comissão de ética da instituição.
RESULTADOS
Na amostra constituída por 207 indivíduos, constatamos que 9,7% dos doentes chegaram algaliados ao CHBV e 90,3% foram algaliados nesta unidade, sendo a maioria (58,9%) algaliados no Serviço de Urgência.
Quanto à caracterização sociodemográfica da amostra, predominaram indivíduos do sexo feminino (N=126; 60,9%), com média de idades de 78,52 (± 13,106), mínimo de 19 e máximo de 100 anos.
A média de dias de algaliação foi de 3,77 dias (±4,355), com mediana de 2 (mínimo 0 e máximo 29 dias) para um N= 146. Foram excluídos os doentes que faleceram (N= 31, 14,9%), os que foram transferidos de serviço (N=4, 1,9%) e os que saíram algaliados do serviço por apresentarem critério válido para manter a algaliação (N=26, 12,6%). Relativamente à razão da algaliação, salienta-se que o mesmo doente pode estar algaliado por diferentes razões durante o internamento. Na tabela 1, encontram-se descritos os vários motivos para algaliação bem como o número de doentes algaliados por cada motivo.
Tabela 1: Critérios para algaliação nos doentes internados no Serviço de Medicina de Outubro de 2017 a Abril 2018. Aveiro, Portugal, 2018 (N=207)
Critério para algaliação | N | % |
Monitorização diurese doente crítico | 66 | 31,9 |
Retenção urinária | 64 | 30,9 |
Ferida ou Ulcera de Pressão | 30 | 14,5 |
Medidas conforto/cuidados paliativos | 2 | 1,0 |
Pós-operatório | 1 | 0,5 |
Monitorização diurese | 78 | 37,7 |
Na figura 1está representada a relação entre as variáveis sexo, idade e retenção urinária.

No que diz respeito ao número de tentativas de desalgaliação, em 50% dos casos os doentes ficaram desalgaliados na primeira tentativa de desalgaliação, o máximo de tentativas de desalgaliação foi de cinco vezes, devido a sucessivos episódios de retenção.
A figura 2 representa a variação do número de tentativas de desalgaliação dependendo do sexo do doente.

Foram realizadas uroculturas a 53,6% (N=111) dos doentes, e em 10,6% (N= 22) foram isolados microorganismos multirresistentes como mostra a tabela 2.
Tabela 2: Microorganismos multirresistentes presentes nas uroculturas realizadas a doentes algaliados de Outubro de 2017 a Abril 2018. Aveiro, Portugal, 2018 (N=22).
Microorganismo Multiresistente | N |
Acinectobacter Baumani | 1 |
Escherichia Coli | 4 |
Enterococcus Fecalis | 2 |
Enterococcus Faecium | 1 |
Estafilococus Epidermidis | 1 |
klebsiella Pneumoniae | 7 |
Klebsiella Pneumoniae Carbapenemase | 3 |
Proteus Mirabilis | 1 |
Pseudomonas aeruginosa | 2 |
Relativamente às hipóteses testadas, constatou-se que a variável idade não interfere com o tempo de algaliação (p-value = 0,815> α = 0,05). Não existem diferenças estatísticas significativas entre homens e mulheres no que diz respeito à duração da algaliação (p-value = 0,624> α = 0,05).
No que diz respeito à variável retenção urinária, p-value= 0,008 < α = 0,05, existem diferenças estatísticas significativas entre os doentes que fazem episódios de retenção e os que não fazem, permanecendo algaliados mais tempo os doentes com episódios de retenção.
DISCUSSÃO
O maior fator de risco para adquirir uma ITUSV é a permanência da SV, sendo necessário reduzir o número de algaliações e dias de permanência(7-8). Assim, no presente estudo, constatou-se que a média de dias de algaliação dos doentes internados no Serviço de Medicina Interna foi de 3,77 dias, após a implementação do Projeto de Melhoria Contínua “No desalgaliar é que está o ganho”. Noutros estudos(6,10), foi de 3,46 e de 4,9% respetivamente. Neste contexto, conclui-se que a estratégia de melhoria passaria pela avaliação diária da necessidade de manutenção da SV. Assim, a equipa de enfermagem diariamente começou a analisar com a equipa médica a necessidade de manutenção da SV e a registar no processo clínico do doente a razão da algaliação. Nos casos em que já não se justificava a algaliação, procedia-se à remoção da mesma. No entanto, como barreira a este processo salientamos o facto de nos fins de semana e feriados não estar o médico responsável pelo doente no serviço, o que impede a avaliação nesses dias e prolonga os dias de algaliação. Também alguns estudos(6,11), recorrem à implementação de protocolos dirigidos por enfermeiros no sentido de monitorizarem os doentes algaliados e providenciarem a remoção da SV o mais precocemente possível. Em Portugal, também num Serviço de Medicina foi aplicado um lembrete de algaliação, segundo o autor, esta medida simples, sem custos significativos e de fácil aplicação, lembra da presença do cateter urinário e das indicações do mesmo(12). Em todos estes estudos verifica-se a eficácia na aplicação dos mesmos com consequente redução das taxas de ITU.
Na amostra em estudo, constatou-se que a maioria (58,9%), dos doentes foram algaliadas no Serviço de Urgência, o que coincide com os dados obtidos por outros autores(13-14). É esperado que isto aconteça já que o Serviço de Urgência representa em Portugal a principal porta de entrada do doente no Serviço Nacional de Saúde. Na recolha de dados foram sentidas algumas dificuldades em perceber a razão da algaliação no Serviço de Urgência de alguns doentes já que essa informação encontra-se dispersa no processo clinico ou não aparece referenciada. Alguns estudos referem que é no Serviço de Urgência que são colocadas a maioria das SV, sem indicação apropriada(15) e torna-se fundamental a comunicação entre pares aquando da entrada do doente no serviço de modo a perceber o motivo da algaliação.
Constatou-se que 9,7% dos doentes chegaram ao hospital algaliados, e que o principal motivo foi a presença de úlceras de pressão (UP) em doentes incontinentes (5,3%). Cada vez mais é exigido aos profissionais de saúde e consequentemente às instituições que demonstrem a qualidade dos cuidados prestados aos indivíduos, definida a partir de indicadores diversos. Pelo impacto das UP no indivíduo, família e instituição, bem como pelos fatores associados ao seu desenvolvimento, torna-se evidente a razão pela qual a prevenção eficaz das UP é considerada um indicador de qualidade de cuidados prestados e deve ser regularmente avaliado nos serviços de saúde. A obtenção de bons resultados para este indicador provém da melhoria da qualidade dos cuidados, que se baseia na criação de um sistema que aposte na formação dos profissionais, na inovação tecnológica, na melhoria dos procedimentos e na disponibilização de meios, não esquecendo, contudo, a monitorização frequente da sua efetividade (16). De salientar que, embora o aparecimento de uma UP possa dever-se a cuidados insuficientes ou inapropriados, se a UP se desenvolver apesar da aplicação consistente de intervenções de eficácia comprovada, poderá não refletir a qualidade de cuidados. As UP são consideradas um indicador da qualidade dos cuidados prestados (16), têm um impacto negativo na qualidade de vida do doente/cuidador e representam para as instituições de saúde grandes encargos financeiros. Contudo, são muitas vezes assumidas pela sociedade como situações normais e irremediáveis.
Verificou-se em quatro situações, doentes que chegaram algaliados ao hospital sem qualquer indicação. Numa situação, o doente estava algaliado há vários anos tendo sido assumido como algaliado crónico, mantendo a SV porque segundo o doente/cuidador já não era necessário mudar a fralda. Estes cuidadores têm a perceção que a algaliação é isenta de riscos. A presença de SV pode provocar para além da ITU, complicações como a inflamação uretral não bacteriana, deficiência de mobilidade, estenose uretral e trauma(8).
Predominaram os indivíduos do sexo feminino 60,9%, e a média de idades foi de 78,52 (± 13,106). Outros autores(13,17) obtiveram resultados semelhantes. De salientar que as pessoas que têm maior risco de desenvolver ITU são as mulheres, os idosos e os doentes com baixa imunidade(5), tal como se verificou neste estudo.
Na comparação entre homens e mulheres, constatou-se que em ambos os grupos (50%) ficam desalgaliados após a primeira tentativa, não se verificando discrepâncias entre os grupos. Relativamente ao tempo de duração de algaliação, verificou-se que não existem diferenças estatísticas significativas no que diz respeito à duração da algaliação (p-value = 0,624 > α = 0,05). A variável idade não interfere com o tempo de algaliação (p-value = 0,815> α = 0,05). Na pesquisa desenvolvida não foram encontrados estudos semelhantes relativamente a estes dados.
Seguindo por referência os critérios definidos pelo CDC 2009 para a algaliação, verificou-se que as razões predominantes para a algaliação foram a monitorização de diurese em doente crítico (66 situações). Segundo a Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos, o doente crítico é “aquele em que, por disfunção ou falência profunda de um ou mais órgãos ou sistemas, tem a sua sobrevivência dependente de meios avançados de monitorização e terapêutica.” Considerámos diurese em doente crítico, no presente estudo, doentes com ventilação mecânica não invasiva, ou com falência de órgão com necessidade de medicação vasopressora. Com base na definição de doente crítico da Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos, constatou-se através da consulta de outros estudos, que nem sempre é realizada a diferenciação entre “diurese em doente crítico” e “diurese em doente não crítico”, o que se torna uma limitação à análise comparativa. Evidenciou-se também que a definição de “diurese em doente crítico” carece de alguma clareza o que pode ser um obstáculo na sua adequada classificação.
A retenção urinária ocupou o terceiro lugar no estudo, no motivo de algaliação (64 situações). Outros estudos constataram que a principal razão para a algaliação foi a retenção urinária (42,3%), seguida da monitorização da diurese (19,2%)(18).
Verificaram-se diferenças estatisticamente significativas relativamente ao tempo de algaliação entre os doentes que fazem episódios de retenção e os que não fazem. Os doentes com retenção ficam algaliados durante mais tempo. Consideramos importante ainda no âmbito deste projeto e numa fase seguinte compreender os motivos que levam à frequência dessa retenção urinária (patologias dos doentes, medicações que realizam) e desenvolver estratégias com vista à diminuição deste resultado.
Neste estudo, em 78 situações a algaliação do doente foi prescrita pelo médico para contabilização de diurese. A grande maioria dos doentes internados no Serviço de Medicina não colabora com a contabilização da urina devido ao seu grau de dependência, alteração do estado de consciência e incontinência, contudo considera-se importante a adoção de estratégias alternativas à algaliação, como referido pelo CDC 2009, nomeadamente utilização de dispositivos não invasivos. A algaliação para controlo de diurese é uma atitude terapêutica sob prescrição médica, no entanto, o enfermeiro tem um papel fundamental como elemento integrativo de uma equipa multidisciplinar na abordagem e discussão com o médico assistente no sentido de procurarem em conjunto alternativas à algaliação(19).
Um critério que merece um olhar atento das equipas de enfermagem continua a ser a existência de UP. Neste estudo, em trinta situações, o doente permaneceu com SV por presença úlcera de pressão. Os dados epidemiológicos portugueses mais recentes são relativos aos cuidados hospitalares, onde a prevalência média de UP é de cerca de 11,5%. Estratificando por serviços específicos, como os serviços de medicina, a prevalência média sobe para 17,5%(20).
Nas uroculturas realizadas aos doentes algaliados constatámos que os microrganismos multirresistentes mais frequentes foram klebsiella Pneumoniae e Escherichia Coli. Em Portugal, no último inquérito de prevalência a Escherichia Coliocupava o primeiro lugar e a Klebsiella Sp ocupava o segundo lugar(21).
Os bacilos gram-negativos são os principais agentes causadores de ITU(22), como também foi verificado neste estudo. Na atualidade, a crescente prevalência da colonização ou infeção por estirpes Gram negativas resistentes aos antibióticos habitualmente utilizados no seu tratamento, constitui um problema emergente(23), que necessita de uma abordagem multimodal e um envolvimento sério baseado na evidência científica de todos os profissionais de saúde, com vista ao seu combate.
Tiveram alta do serviço, algaliados 12,6% dos doentes, por apresentarem critério válido para algaliação. O acompanhamento destes doentes por parte da equipa de cuidados de saúde primários é fundamental através de uma avaliação frequente da necessidade de manutenção deste tipo de dispositivo. Além disso, o ensino aos cuidadores sobre os cuidados na manutenção deste tipo de dispositivo é essencial para a prevenção de ITUSV.
CONCLUSÃO
Neste estudo os principais motivos para a algaliação dos doentes no Serviço de Medicina Interna foram monitorização de diurese em doente crítico, retenção urinária e monitorização de diurese.
Existem diferenças estatísticas significativas entre os doentes que fizeram episódios de retenção e os que não fizeram permanecendo algaliados mais tempo os doentes com episódios de retenção. As variáveis sexo e idade não influenciaram o tempo de algaliação dos doentes.
Após a implementação deste projeto a média de dias de algaliação reduziu de 7,14 para 3,77 dias.
É de extrema importância o registo no processo clínico do doente do motivo da algaliação. Os profissionais de saúde devem diariamente avaliar a necessidade de manutenção da SV. Assim, sugeriu-se ao grupo do Sclinico a criação de chamadas de atenção na plataforma informática alertando para a presença deste tipo de dispositivo bem como a sua pertinência.
Concorda-se que no Serviço de Urgência deve ser efetuado o registo do motivo da algaliação permitindo aos profissionais do serviço de internamento uma mais fácil colheita de dados possibilitando a prestação de cuidados de qualidade.
Em parceria com a equipa médica pretende-se elaborar protocolos de atuação em situações de retenção urinária bem como protocolos que permitam a desalgaliação precoce em doentes com registo de diurese.
Sente-se necessidade de realizar outros estudos para perceber quais os fatores que contribuem para a retenção urinária, bem como estudar de forma mais exaustiva as ITUSV.
A excelência dos cuidados só é possível através da monitorização dos dados e da parceria entre os diferentes grupos profissionais centrando os cuidados na pessoa doente.
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